Mochilas nas costas, bilhete na mão e mais de dez horas de ônibus. Partimos os quatro rumo à Algeciras, última cidade espanhola antes de chegarmos à África. Eu, representante feminina do quarteto, Kiko e Hugo, amigos portugueses que aceitaram se arriscar comigo e Paixão, amigo do Hugo que caiu de pára-quedas no grupo. A travessia de ferry foi tranquila o suficiente para contrastar com o primeiro táxi em que entramos em de Ceuta, cidade espanhola já no território africano. Com uma música pseudo-típica ouvida numa altura desconcertante chegamos à fronteira, que teríamos que atravessar a pé para pegar outro táxi do em chão marroquino.
Ali mesmo já começaram as tentativas de nos arrancar alguns dirhams, fato com que teríamos que conviver ao longo de dez dias. Depois de apresentados os passaportes e cumpridas as burocracias obrigatórias, nos vimos cercados por taxistas que insistiam em preços absurdos para nos levar num “strong Mercedes” até o nosso primeiro destino: Chefchouen. Já nesse momento eu pude perceber que não teria voz ao longo da viagem. Ainda na esperança de ser ouvida durante as negociações, balbuciei alguns argumentos que foram solenemente ignorados por todos os taxistas. Apenas uma pessoa não me ignorava: um menino com cerca de 10 anos, que puxava meu capuz. Como a toda ação corresponde uma reação, numa fração de segundos vi o menino ser lançado no meio da rua, talvez para ser afastado a única mulher que ali estava, talvez para não atrapalhar a discussão dos preços, talvez para ser mantido longe das nossas bagagens. A partir dali eu pude ter noção da realidade com que iria conviver pelos próximos 10 dias.
Já esperava ver um país pobre e conservador, mas o que se encontra é mais que isso. A cada esquina Marrocos se revela como um país subdesenvolvido – ou em desenvolvimento, como queiram classificar – que tenta de várias maneiras resistir à influência do mundo ocidental. A música típica e o olhar submisso das mulheres contrastavam com algumas meias da Nike e com os casacos da Adidas que se viam ocasionalmente por baixo das jilabas e das babuskas. Esses indícios de uma globalização que teima em estar presente em todos os cantos, no entanto, não serviram para amenizar o choque cultural vivido ao longo de dez dias. O período de convivência intensiva com uma das culturas mais ricas e diferentes que já vi foi um verdadeiro exercício para o meu etnocentrismo camuflado. Em determinados momentos, nem eu saberia dizer se estava sendo preconceituosa ou se estava agindo como uma típica ocidental, no pior sentido que isso pode ter. Fato é que cheguei ao final da viagem acreditando menos em estereótipos e mais no que meus olhos vêem, sem efeitos especiais e sem as edições dos canais de turismo.
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