O Estado Independente... E inatingível.

Depois de ver a bancada onde Mussolini fazia seus discursos resolvi visitar o Estado do Vaticano, uma de suas maiores criações. Chegar à Praça São Pedro e olhar de frente para uma das maiores construções religiosas do mundo não é suficiente para se ter idéia da dimensão do menor Estado independente que existe. Numa espécie de "Nave Mãe", a basílica de São Pedro é como a célula matriz de um organismo que se espalha pelas ruas da capital italiana... Uma volta mais atenta pelas ruas de Roma permite que vejamos a sede da Rádio Vaticano, da TV e de mais alguns outros instrumentos fundamentais para a saúde política de qualquer governo. A sede do Estado e a casa do Papa são megalomaníacas. A arquitetura fascista que tanto atraía Mussolini na década de 20 foi definitivamente deixada para trás na hora de se pensar na construção da Praça e da Basílica. Nada de prédios iguaizinhos, com janelas quadradas e sem grandes ornamentações: duas fileiras semi-curvas de colunas se encarregam de direcionar todos os olhos para a Basílica que se ergue em puro mármore. Minha afeição por Igrejas em geral e minha religiosidade adormecida já tinham sido ponderadas junto ao valor histórico e artístico do local e a entrada no complexo de museus do Vaticano, na Basílica e na Capela Sistina já estava certa. Mesmo que para isso eu tivesse que pagar a módica taxa de 20 euros para conhecer os aposentos públicos do Papa. Não sei se foi um milagre de Deus, mas a verdade é que o tio da Sabrina trabalha na área de restauração dos Vaticano, o que ajudou (e muito!) a mantermos nosso orçamento imaculado e a evitarmos as 3 possíveis horas de fila. O sentimento de culpa eu deixei para aqueles que realmente fizeram coisas erradas... Ninguém me convence de que o Vaticano precisa de fato de 20 euros (multiplicado por milhões de vezes diárias) para simples manutenção e que o resto desse dinheiro é investido em caridade. Se assim fosse, pelo menos em frente à Basílica, não teríamos visto tantos pedintes.Ver o acervo do Museu Vaticano é tarefa para mais de um dia. Não consigo nem tentar mensurar o valor daquilo tudo que estava exposto, mas já é o suficiente para confirmar o clichê de que a Igreja é um dos órgãos mais ricos do mundo. No entanto, é inegável também o investimento feito no campo artístico. Menino prodígio, Michelangelo terminou a famosa Pietá aos 23 anos e teve que encravar seu nome na escultura para que os méritos fossem devidamente atribuídos. De precisão incontestável, a estátua nos prepara para entrada na Capela Sistina. Se é possível existir perfeição, acredito que ela esteja estampada num dos tetos mais famosos do mundo. Não imaginava uma coisa tão exata quando me falavam da Capela de Michelangelo e de fato fiquei surpresa. Figuras religiosas que quase saltam em nossas cabeças povoam o teto da capela que dispensa qualquer outro tipo de adorno. Injustiça feia, no entanto, a que todos cometem: falar só do teto e ignorar a parede do altar, que ilustra o juízo final, é colocar em segundo plano um elemento que tem tanta capacidade de ser protagonista quanto o outro.De qualquer modo, estar ali e perceber que aquele mundo é praticamente inatingível pela Lei e está nas mãos de uma única figura que não é submetido a nenhum órgão de fiscalização e que não deve prestar contas a ninguém incomoda bastante. Ainda mais quando se ponderam o poder e a riqueza que ele tem em mãos... A idéia de considerar um homem o emissário de Deus na Terra e colocá-lo acima de todos os outros mortais já não me convence há muito. Fosse ele o carismático João Paulo II ou o Ratzinger, o Papa com cara de vilão de filmes infantis... A verdade é que, depois dessa estadia italiana, quanto maior o número de igrejas visitadas, menor a minha identificação com uma religião. Seja ela qual for...